Dois gémeos idênticos são
suspeitos de vários crimes de violação em Marselha (França). Mas, como têm o
ADN igual, nem os testes os distinguem. Qual será o culpado? Serão os dois
culpados? É um dos maiores quebra-cabeças com que a Justiça alguma vez se
deparou. (…)
O caso é o seguinte: entre
setembro de 2012 e janeiro deste ano, houve seis violações num bairro daquela
cidade. O culpado está identificado e preso. O culpado? Não, os culpados,
embora tenha sido só um a praticar os crimes. Ou terão sido os dois?
(…) O problema é que os crimes aconteceram
efetivamente e os principais suspeitos são dois irmãos gémeos idênticos de 24
anos, identificados apenas como Elwin e Yohan. Os indícios colhidos no corpo
das vítimas – sémen do criminoso, cabelos, sangue – atestam a identidade do
violador. Mas, mesmo tendo ambos sido presos em fevereiro, o problema
mantém-se: a qual deles pertence estes indícios? A solução parece óbvia:
façam-se os infalíveis testes de ADN. O problema é que os gémeos monozigóticos
(ou idênticos) partilham o ADN em 100%. Ou seja, eles são iguais até a um nível
microscópio.
O verdadeiro culpado (ou
culpados, caso tenham sido os dois os autores dos crimes, o que também é
possível) só poderá ser descoberto por testes genéticos mais afinados. A
polícia francesa avança que os testes clássicos aplicados à ciência forense
seriam insuficientes e uma verificação mais exaustiva pode custar um milhão de
euros, avança a BBC em linha a propósito do caso.
Alguns peritos, entretanto,
chegaram-se à frente. Um dos grupos, citados pela revista especializada Popular Science, recorda um caso
semelhante ocorrido no Michigan (EUA) em, 2004. Na altura, a polícia teve de
recorrer a um laboratório ultraespecializado para poder detetar mutações
genéticas que distinguissem este par de gémeos. Mas não conseguiram e não houve
condenações. (…)
De qualquer modo, outros
especialistas indicam que estudos que analisassem algumas marcas químicas do
ADN poderiam ir mais longe, tendo em conta que os gémeos são expostos a
diferentes condições do meio logo após o nascimento. Mas este método teria de
ser combinado com uma sequencialização completa do genoma de Elwin e Yohan, o
que custaria, não o milhão de euros estimados, mas alguns milhares. O problema
ia dar sempre ao mesmo beco sem saída: não haveria garantias, no fim, de
conseguir distinguir os gémeos um do outro. Mais uma vez, não haveria a certeza
de se “acertar no alvo”, pois ninguém sabe ao certo, á partida, quais são os
tecidos onde se podem encontrar as mutações. E \um estudo aprofundado exigiria
que se analisasse um grande número de tecidos nos dois suspeitos.
Sem certezas na metodologia
a aplicar, estes testes ainda não oferecem a segurança necessária para poderem
ser usados em tribunal. Outro caso, este sem a gravidade de um ataque sexual,
foi um assalto levado a cabo por um dos elementos de gémeos em Berlim (Alemanha)
em 2009. Os testes de ADN levaram, mais uma vez, ao clássico beco sem saída.
Eles não se distinguem. O desfecho foi o mesmo do caso norte-americano de 2004,
não houve condenações, na dúvida de se levar à cadeia o gémeo inocente. No fim,
como sempre, quem riu por último riu melhor. Um dos irmãos declarou, jocoso: “Estamos
orgulhosos do sistema legal alemão”.
NABAIS,
R.,
“ADN: o que fazer perante gémeos suspeitos de crime?”